quinta-feira, novembro 29, 2012

À mesa com Aguinaldo Silva

Foi um jantar memorável que a minha querida amiga Cristina Pombo promoveu entre dois amigos comuns que andavam para se conhecer há que tempos. Tive assim o privilégio de passar belíssimos momentos com um homem de quem sou absolutamente fã. Aguinaldo Silva, guionista soberbo, autor de novelas de culto de inesquecível memória - Tieta do Agreste e Roque Santeiro por exemplo! - de séries premiadíssimas e de livros, como por exemplo 98 Tiros de Audiência editado em 2009 pela Contraponto, que já comecei a ler, deliciada.

Por acaso, ou nem por isso, Aguinaldo já conhecia alguns livros meus como Imperatriz Isabel de Portugal que lhe foi oferecido recentemente. Para além disso estava bastante interessado nos Jardins Secretos de Lisboa e na historia da Maria Adelaide Coelho da Cunha. Aliás trocamos obras, ele ofereceu-me o seu último livro, eu dei-lhe os Jardins e a Cristina ofereceu-lhe a história da senhora que fugiu com o motorista e trocou um palácio por uma casa modesta em Santa Comba Dão, acabando por ir parar ao manicómio etc. etc. «Que história fantástica» - comentava ele, que ate já tinha lido artigos sobre o tema e o livro.

Falamos de tanta coisa! Cruzaram-se tantas histórias. Rimos tanto e comemos tão bem no Olivier, que até veio à mesa cumprimentar aquele homem lindo, grande e de cabelo todo branco que Portugal inteiro conhece e ama e que o Brasil venera. E, inevitavelmente, falamos de Lisboa porque essa é uma paixão que nos une. E do céu que nos cobre com um manto azul luminoso e tão doce como não se vê em mais lado nenhum do mundo vasto e pequeno que nos abriga na viagem de viver.
Obrigada querida Cristina e obrigada Vitor, que tirou as fotografias e também tem muito para contar.
Entretanto, visitem o blogue do Aguinaldo, que tem link para o seu portal. 

domingo, novembro 25, 2012

Isabel de Portugal, Fernão de Magalhães e as ilhas de Maluco


Isabel de Portugal, seguramente a mais rica princesa da Cristandade, não levava apenas um dote soberbo que tão necessário era às arcas sempre tão vazias do seu noivo. Nas palavras de Damião de Góis, «Mulher alguma que não fosse herdeira» trouxe em casamento tão grande dote a seu marido: novecentos mil cruzados em «dinheiro de contado» – dobras de ouro castelhano –, e mais cem mil em jóias e enxoval. Mas a par dessa fortuna a imperatriz ia incumbida de sanar, ou ajudar a ultrapassar, alguns conflitos pendentes entre ambos os reinos. Um deles, seguramente o mais espinhoso, remetia para Fernão de Magalhães e sua incrível descoberta que abrira, por Ocidente, o caminho marítimo do Oriente que levava às ilhas das Especiarias. E estas, segundo defendiam os espanhóis, caía em tombo de Castela.  
 
O que se passara?

Uma grande mágoa. Navegador e soldado, Fernão de Magalhães provara a sua valentia em África e nos sete anos que andara pelo Oriente. Combatera com D. Francisco de Almeida e Afonso de Albuquerque. Lutara com denodo em Malaca, o verdadeiro empório comercial de todo o Oriente, a artéria do comércio muçulmano que Afonso de Albuquerque havia jugulado. Combatera nos presídios de África. De uma ferida em Azamor, ficou mesmo a coxear para o resto da vida. Das calúnias que aí o davam por ladrão, e que feriram mais do que tudo, conseguiu ilibar-se. Mas quando se apresentou diante rei, uma vez e outra, pedindo-lhe um aumento da sua moradia, D. Manuel recusou. E o «leve agravo» – nas palavras do bispo de Silves – «abriu tão profunda chaga» no seu ânimo que Fernão de Magalhães se apressou a trair o rei «que o educara, a pátria que lhe dera o ser», e afrontado – em Jerónimo Osório o vocábulo é «comovido» – o valoroso fidalgo quebrou a sua lealdade e «pôs a república em extremo perigo».

Enfim, passou-se para Castela apresentando-se ao rei D. Carlos para o advertir que as ilhas de Maluco, assentadas para além da aurea chersonesus – o estreito de Singapura –, lhe pertenciam. Acompanhava-o Rui Faleiro, português de nação, astrólogo judiciário, também ele agravado do Venturoso, que o não o quisera tomar para este ofício, embora fosse coisa de que D. Manuel tinha muita necessidade.
E finalmente, na vila de Valhadolide a 22 de Março de 1518, Magalhães afirmou perante o jovem rei e a sua corte de Castela que aquelas ilhas caíam em tombo do Sua Majestade, invocando o testemunho dos astros, mapas e informações privilegiadas. [...]

Em Manuela Gonzaga (2012) -- Imperatriz Isabel de Portugal, Lisboa, Bertrand, 142 e segs.

Algumas fontes consultadas:
Para o dote de dona Isabel: 
Damião de Góis (1926) – Crónica do felicissimo Rei D. Manuel, 4 partes, I, cap. lxxv.Em
Braancamp Freire, «Ida da Imperatriz D. Isabel para Castela, encontram-se recolhidos vários documentos relativos ao dote de Isabel, cf. 83-84; 91-100; 100-101; 103-104. Em
Especificado em todos os detalhes em, Capitulaciones matrimoniales de Carlos V e Isabel, Toledo, 24/10/1525, Fernández Álvarez, Corpus Documental de Carlos V (cinco volumes, 1973-1981), I, 100-115; HGCRP, III, cap.vi, 146.
Para Fernão de Magalhães:
João de Barros, Décadas, Dec. III, Liv. V, cap. viii (onde se fala nos negócios de Fernão de Magalhães). D. Jerónimo Osório (1944), Da Vida e Feitos de El-Rei D. Manuel, 2 vols.,II vol. 225-226.