quarta-feira, junho 11, 2014

Vila Cabral, Meponda, Niassa

Não havia termo de comparação. Nem para a paisagem, nem para as vilas ou pequenas cidades do interior do vastíssimo território. Para começar, era tudo novo. A cidade tinha nascido anteontem. Depois era tudo longe. Por fim, os tempos estavam trocados. Um pinheirinho lânguido, enlaçado por gambiarras de luzes estridentes, de onde pendiam lânguidos pedaços de algodão, permanece com uma espécie de marco de lonjuras, estranhezas, melancolia e exultação, a ilustrar o nosso primeiro Natal em África, em Meponda junto ao lago Niassa. na Pousada onde ceámos, ouvimos musica e até dançamos ao som dos Platters e de mornas de Cabo Verde.

A beleza do lugar era avassaladora, a noite cálida, o luar perfeito. Mas as minhas jovens amigas do Porto da minha infância, com quem poderia falar horas sem fim sobre o que se estava a passar, tinham ficado tão longe, que quando nos voltássemos a ver nada disto teria qualquer importância. Aos doze anos, estas são feridas que ardem sem se ver.


Junto a uma pequena barragem perto de Vila Cabral, actual Lichinga


Meponda ficava a cerca de 60 quilómetros de Vila Cabral  - actual Lichinga -  capital do Niassa, que ficava e fica a cerca de 2800 km de Lourenço Marques, actual Maputo. Mesmo para os padrões africanos onde as distâncias são genericamente reduzidas a um «é já ali» - era muito quilómetro.

Para nós, acabados de chegar, era um fim do mundo. E o recomeçar de outro. Nenhum livro de aventuras, nenhum bloco noticioso, nenhuma aula de geografia, me preparara para ele. Era preciso descobrir dentro de mim, toda uma nova paisagem. De afectos.

Vila Cabral, actual Lichinga, vista aérea anos 60

[Adaptado de Moçambique para a mãe se lembrar como foi de Manuela Gonzaga]


[1] A povoação, fundada em 1931, foi elevada a cidade em 23 de Setembro de 1962. O seu nome era uma homenagem ao ex-Governador José Cabral na Índia e em Moçambique durante 20 anos. Depois da independência foi renomeada Lichinga.


 

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