quarta-feira, outubro 29, 2014

Partidas e chegadas ao aeroporto de Lourenço Marques

O J. Fróis não tem televisão - muitos de nós já não têm - apesar de já lhe querem ter oferecido vários magníficos plasmas. Motivo? Ficava a olhar o dia inteiro para aquilo e não fazia (quase) mais nada. Disse-me ele. Como eu o entendo. A caixinha é viciante. Mas o João também não tem espaço nas redes. E  há mais de um ano que deixou até o blogue que, ao que que parece, era muito visitado. Motivo? Ficava agarrado àquilo e não fazia mais nada.

O JF é artista e faz mil e uma coisas - pinta, por exemplo, e eu sei que vou gostar muito de ver os quadros dele. Não nos vemos há décadas, e, curiosamente, encontrámo-nos graças às redes. Uma amiga minha e dele, que anda por aqui, felizmente!, encontrou-me. Depois, ofereceu-lhe o livro Moçambique para a Mãe se lembrar como foi, onde o J. Fróis aparece em vários episódios. Fomos companheiros de letras, camaradas de trabalho portanto, no jornal Notícias de Lourenço Marques, onde debutei na mais apaixonante das profissões. O jornalismo. Assinámos reportagens juntos e tudo - que eu redescobri, divertida, comovida, maravilhada, quando andei pela BN a ler jornais de época, sobretudo o Notícias, na minha pesquisa para o livro.


 Sede do jornal Notícias em Lourenço Marques, na esquina das ruas Joaquim Lapa e da Maxaquene
[cortesia The Delagoa Bay World]


Troca de emails, e mensagens no FB para aqui e para ali, eis que o J. Fróis e apareceu em boa hora no meu telemóvel e desatámos a rir e a falar como se nos tivéssemos visto anteontem pela ultima vez. Para meu grande alívio, descrições de eventos e até de espaços, e em que ele entrava, e que evoco no livro, e que nalguns casos foram apoiada apenas na minha memória, estavam certas. Rigorosamente certas. Aliás, foi com muita alegria que o ouvi registar, a propósito da investigação à volta de tudo o que escrevi agora sobre os nossos dias de ontem: «O trabalho que tiveste!!» - disse.

Naturalmente, O Fróis não se recordava do episódio em que eu o encontrei e perdi e reencontrei e perdi e reencontrei no aeroporto da então LM, no meu trabalho de reportagem que tinha por titulo «Chegadas e Partidas». Era um trabalho muito básico, próprio da repórter estagiária que eu era. Saber para onde iam e de onde vinham e eventualmente porquê, os famosos que chegavam e partiam à capital da Princesa do Índico. Famosos que eu não conhecia de lado nenhum. Nem de cara, nem de nome. Sempre fui uma outsider... portanto não houve reportagem.

O Fróis, que encontrei para meu imenso alivio e que prometeu ajudar-me nesse terrível transe, transformou-se em Gato de Alice no País das Maravilhas e não me foi de utilidade alguma. Ora ali, e naquelas circunstancias, ele era o único famoso que eu conhecia. E era famoso, porque era meu amigo. Os outros, nem as caras conseguira reter, apesar de estarem dia sim, dia não, plasmadas nas primeiras páginas do jornal onde eu trabalhava, e que, de resto, não lia. Digo, a parte chata. A parte politica do regime - com os discursos e tal.
Ah, Fróis que bom ter-te reencontrado. Afinal, não inventei. Eu sabia, mas... quando contamos a nós próprios as mesmas histórias vezes sem conto, simplesmente porque não há ninguém para as ouvir, chegamos a ter dúvidas onde começa a imaginação a invadir as nossas verdades. Tento sempre, mas sempre, na vida, traçar a fronteira. Quando somos um pouco loucos, é preciso ter-se muita atenção aos pormenores. É assim que sabemos quando estamos a sonhar e quando estamos acordados. É assim que nos mantemos à tona destas turbulentas águas.

É que bem basta o que basta.

Nota: The Delagoa Bay World foi um dos blogues fundamentais na minha pesquisa pelas redes sobre os tempos dos nossos dias de ontem.

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