quinta-feira, janeiro 21, 2016

O «refugiado» apaixonado

O irmão do meu amigo apaixonou-se por um jovem e belo turco que conheceu nas redes sociais e que, muitas mensagens, sms, video chamadas e outras aplicações cibernéticas, veio mais tarde a conhecer em molde multidimensional.  O encontro dos dois, em Paris, confirmou o mútuo encantamento. O irmão do meu amigo, que vive na Escócia, e o seu jovem amante resolveram juntar destinos no Reino Unido, onde o primeiro tem residência. Mas a viagem de turismo não permitiu o desejável visto de residência do segundo. Desolados, encararam outras opções. Inclusivamente Portugal, de onde o irmão do meu amigo saiu há muito tempo e para onde não fazia tenção de voltar a não ser em caso de força maior.

O amor é um caso de força maior.

Mas o jovem turco não esteve ajustes. Adorou a Escócia, quis à viva força ir espreitar o lago para encontrar a Nessie, e declarou que só saía de Ancara para Edimburgo. Com o coração às postas, separaram-se fisicamente, mas o amor prosseguiu pelos circuitos alternativos. Skype e afins. Até que o turco teve uma ideia e pô-la em prática. Meteu-se num barco de imigrantes/refugiados (não sei detalhes, nem preços, nem nada) e aportou à Grécia.

Durante um ou dois meses, o irmão do meu amigo esteve inconsolável. Sabia muito pouco do que se estava a passar porque em certas circunstâncias os telemóveis, cartões de crédito e outros dispositivos electrónicos são de evitar em absoluto. Por fim, a boa nova: amor estou aqui, a ilha é linda, é tudo lindo, a comida é lindíssima, e o mais belo de tudo é que consegui visto como refugiado. Amor, afinal não faço questão da Escócia, vem ter comigo e ficamos pela Grécia.

O diálogo, em inglês, é uma adaptação livre de muitas mensagens trocadas que agora já não interessam para nada. O que interessa mesmo é a substância dos factos. Por motivos nobres - o amor é o mais nobre dos motivos, à excepção de salvar a vida própria ou da família - um jovem galgou fronteiras e a cavalo nas ondas mediterrânicas ganhou sem problemas um estatuto que lhe permite ser cidadão europeu, enquanto refugiado.

Pintura em terracota, Grécia

Um estatuto que, pelos vistos, muitos outros ganharam sem qualquer problema. Hordas selváticas de homens sós, sem mulheres nem filhos, que avançam e se instalam com os resultados de que, em doses homeopáticas vamos tomando conhecimento... Refugiados de guerra? Toda a minha solidariedade está com eles. Mulheres e crianças primeiro. Mas estas, para nossa enorme vergonha e desgosto, têm sido abusadas, violadas sem contemplação, nos campos onde as acolhem, sem que as autoridades interfiram. O escândalo só rebentou quando tocou às «nossas» que nas festas de passagem de ano foram vitimas das bestas a quem as políticas estranhas de uma Europa estranhíssima abriu os diques da entrada. Com tão pouco cuidado e tamanha ausência de critério que só pode ser de propósito.

No meu coração, disse e repito: abro os braços e as portas às famílias em fuga. Usadas como tampão. Por todos. A começar pelos... «nossos». Porquê? Sim, porquê?  

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