sábado, julho 18, 2009

O Manuel de Oliveira veio ao meu sonho


II parte
A minha muito jovem professora de surf diz: «vamos começar imediatamente». O mar está diante de nós. Estamos na estrada quase deserta, ela começa a andar na direcção da praia. «Não trouxe fato de banho» – digo. Já não estou tão segura de querer começar as minha aulas de surf. Penso: «Devia ter começado em jovem». A professora atira-me um disco de plástico azul: «Primeiro os treinos, no asfalto». E começa ela própria a deslizar pela estrada, velozmente. Porém, sempre que atiro o disco para o chão, tentando saltar para cima dele, o disco voa. Até que desaparece. Encontro um cesto de plástico, desses de guardar a roupa passada a ferro, e utilizo-o para o mesmo efeito. Descubro que é surpreendentemente fácil, embora exija flexibilidade de movimentos, força de pernas e braços, e firmeza nos pés. Em pequenas estradas secundárias, essas com gente, sinto o prazer imenso de deslizar, a grande velocidade, o meu corpo cheio de uma sabedoria instintiva. Liberdade.
E agora estou de novo junto do mar, com o Manuel de Oliveira a olhar para mim:
«Onde ficava, exactamente, a sua casa?» -- ele pergunta. Tem um mapa na mão. Estamos no Porto. Digo-lhe. Estamos perto, aliás. Ele responde: «não é essa. Onde era a sua casa, antes de nascer?» Julgo que se refere à casa dos meus avós: «Rua Antero do Quental». Acrescento: «o António Lopes Ribeiro mora ao lado. Eram amigos.» Ele parece comovido, porque conheceu o meu avô. Refere factos, datas, locais, que o comprovam. Até conhecia a Tipografia Porto Médico, na Batalha, quer o meu avó fundou e de que era proprietário: «à volta dela havia uma tertúlia de gente muito boa» – acrescenta.
Estamos em casa, numa sala de jantar. A mesa, comprida, está entre nós. Agarro-me ao espaldar de um cadeira com força, para contrariar a sensação de irrealidade que me invade. Penso: «este homem tem cem anos e ninguém lhe daria mais de 70.» Ele tem um fato cinzento, uma gravata clara, o cabelo cor de prata, o sorriso afável e parece estranhamente comovido. Sinto um choque:
– Isto é um sonho, entende? Não estamos aqui. Eu estou a dormir e acabo de descobrir isso mesmo. Só não percebo o sentido disto tudo.
Ele parece sinceramente espantado:
– Como pode dizer uma coisa dessas? Que tolice tão grande, nunca ouvi semelhante disparate. Acha que eu sou uma invenção? Tudo isto que nos rodeia, é uma fantasia? Então e a mesa, não lhe parece suficientemente sólida?
Agorro-me com mais força ao espaldar da cadeira. É sólido, sim, tão sólido como uma coisa sólida pode ser. Fecho os olhos e percebo que se os mantiver assim, mais algum tempo, acabo por adormecer. Logo, estou acordada: «Mas estou acordada dentro do sonho, é o que é» – penso, com profunda convicção.
Abro os olhos e o Manuel de Oliveira ainda ali está, a olhar para mim:
– Vai insistir nesse disparate? – pergunta. Depois continua a falar sobre o meu avô, com o mesmo entusiasmo.

Não respondo. A luz do sol, que entra pela janela grande, desenha um lindo rectangulo dourado sobre o chão escuro à minha direita.

O Manuel de Oliveira veio ao meu sonho

I parte
Presto muita atenção à realidade fluída e banal dos quotidianos sem história. Intensamente. Presto atenção aos meus passos. Aos meus gestos. Aos cheiros, sabores, ruídos, toques que me acordam várias vezes, todos os dias, ao longo do dia.
Há muito pouco tempo – segundos, horas, dias, meses ou anos tanto faz, é sempre antes –, sentia a relva fresca do jardim da Pousada Catarinense, em Abadiânia, afagar-me a planta dos pés nus, os salpicos da água que regava, por etapas, o seu jardim tropical, e, antes de adormecer, segurava com força entre os dedos, os varões da cabeceira de ferro da cama estreita, no pequeno quarto fechado à chave na sua porta de ferro. Muito modesto. Dormia-se tão bem, ali. Depois, os meus passos levavam-me, de manhã e à tarde, à Casa de Dom Inácio, e prestava-lhes, igualmente, atenção com a intensidade de uma criança que brinca. É muito sério, procurar estar acordada dentro da realidade que nos escapa a todos os momentos.
E agora, aqui, antes de adormecer seguro entro os meus dedos os varões de ferro da minha grande e linda cama marroquina de dossel, e digo em silêncio: «isto é verdade, o que estou a sentir é real». Pequenos gestos para nos habituarmos a estar acordados, em qualquer circunstância, tanto tempo quanto nos for possível.
É sempre muito pouco.
Foi neste registo que o Manuel de Oliveira, esse mesmo, esteve no meu sonho esta noite de 17 para 18 de Julho de 2009.

sábado, julho 11, 2009

André e a Esfera Mágica

O primeiro livro da minha colecção «O Mundo de André» entrou para a lista do Plano Nacional de Leitura.
Para o ano, quem sabe? será a vez de André e o Lago do Tempo, e da próxima aventura que estou já a engendrar...
para confirmaçao: http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/upload/obras_recomendadas_actual/5_leit_aut.pdf