quinta-feira, julho 22, 2010

Maria Adelaide no palácio das Galveias

Ontem estive no Palácio Galveias, num encontro membros de um clube de leitores, dinamizado por Ana Jardim, que me convidou pessoalmente, depois da aprovação e leitura por parte de todos. O livro escolhido foi Maria Adelaide Coelho da Cunha: «doida não e não!»
Tenho pena de não poder evocar os nomes das pessoas presentes. A memória anda muito sobrecarregada. Em todo o caso, a conversa foi adorável e o diálogo fluíu do coração. Alguns dos que não puderam estar -- férias, trabalho -- mandaram emails que foram lidos por Ana Jardim, com observações pertinentes e perguntas. Curiosamente, amemórias dos presentes cruzam-se de forma indirecta com a história de Adelaide Coelho. Uma das leitoras viveu nas proximidades do palácio. E recorda como todos, na vizinhaça, se lhe referiam sempre como «a casa da Senhora de São Vicente». Tantos e tantos anos depois. As histórias de vida de algumas outras, também encontravam paralelo na vida de Maria Adelaide. «Dava uma ópera», comentou Ana Jardim, querendo saber a minha opinião.
Que posso dizer? O livro já não me pertence. Cada leitor o faz seu.









Biblioteca Municipal Central – Palácio Galveias

quarta-feira, julho 21, 2010

África nossa

Ontem um jantar. Três amigas que se reencontraram há muito pouco tempo. A Carmo, a Isabel, eu. E a Marta, que nasceu em Luanda mas veio para Portugal ainda não tinha feito três anos.
Angola omnipresente nas nossas estórias por onde desfilaram pessoas, lugares, acontecimentos. Passaram tantos anos e as recordações, quando as evocamos, permanecem esmaltadas de luz. Até as noites escuras têm um brilho ofuscante quando se reconstroiem nas nosssas palavras e risos. Tantos risos. Rimo-nos mesmo a chorar os mortos, que é a forma como os mortos mais gostam de ser recordados.  Essa é uma das grandes liçoes de sabedoria primordial que bebi em África. Bendita Terra-mãe. A outra é que a vida é uma viagem. Curta. Cabe-nos torná-la esplêndida. Ontem, de novo, esta noção acordou os nossos sentidos.
Há poucos meses, na internet. Crianças e adolescentes retomam laços de proximidade. Temos todos entre 12 e 16 anos e vivemos na cidade mais quente do mundo. Tete, Moçambique, nas margens escuras do rio Zambeze. Há um jardim tropical, belíssimo e sofucante, onde as noites ganhavam uma aura mágica. Uma mesquita, a primeira que vi na minha vida. E um colégio-liceu, onde andamos todos. Ali,  onde o meu pai dá aulas de matemática e fisico-químicas, a minha mãe de música. Estão, os dois, em processo de separação litigiosa. Nao existe divórcio entre «católicos apostólicos romanos». E isto decorre numa terra minúscula onde todos, todos, todos, se conhecem e se encontram todos, todos, todos os dias.
Uma dessas jovens de 14 anos, anda por aí activíssima. Lançou  redes luxuriantes com fotos de antes e depois, restabeleceu contactos, e disponibilizou-os neste cérebro colectivo que é a internet,. Entre blogues e FB transformou-se na guardiã das nossas memórias comuns. Tem vários espaços onde  revemos fragmentos das, dos jovens que somos tantos anos atrás. É a Mimi Teixeira, e aqui fica o link para um dos seus jardins.
Outro encontro FB: na página do colégio D. António Barroso também linkado, onde estive dois anos. Interna. Cruzando os céus de Moçambique, entre Vila Cabral e Lourenço Marques, nos regressos de férias ou de partida para novo período de aulas. Gloriosamente entregue à minha própria pessoa, entre mudanças de aviões e aeroportos, durante um dia inteiro que sabia a liberdade total.
O colégio, porém, tinha grades. Mas a qualidade de ensino jamais esquecerei. Na sua página criada por uma antiga aluna, revejo algumas condiscipulas cujo rasto perdi. A lista cresce cada vez mais.
Não encontro palavras para a alegria destes reencontros todos.

terça-feira, julho 20, 2010

Fractais: «o que está por baixo é igual ao que está por cima»

Estávamos à volta da revisão da terceira aventura e a palavra fractal era a única possível para descrever o jardim infinito, infinitamente desdobrado dentro de si mesmo que culminava num labirinto. O «nosso» André passeava por ali. Uma imagem veio-me à cabeça: «bróculos».  Acrescentei-lhe uma explicação básica sobre o conceito. A Rosarinho, editora responsável pela secção infanto/juvenil da Oficina do Livro, ficou satisfeita. De resto, para o desenrolar da história não era importante aprofundar, até porque o próprio André desliga quando o Senhor Leandro aparece e começa a debitar ciência, prestando atenção a outros aspectos do  intrigante homenzinho, cuja mala de médico é um poço infinito de possibilidades...
Pois bem, aqui, numa linguagem perfeita e com imagens de cortar a respiração, estão os Fractais. Pedaços de um todo que é infinito e que se copia a si mesmo em todos os seus fragmento, infinitamente, em réplicas perfeitas, belíssimas e perturbantes. Cada vez mais pequenas. Ou como há milénios se afirmava, por puro conhecimento de causa transcendente, «o que está em baixo, é igual ao que está em cima».
Créditos: Fotos de Human Angels - FRACTALS, the part is the All

sábado, julho 17, 2010

O último cigarro

Uma bela mulher fuma. Não é um cigarro qualquer. É último, diz ela. Passo a passo, recria o ritual de um prazer que desde a Nouvelle Vague nos 60, ou Hollywood, década de ouro, a de quarenta, não assumia tamanha sedução. Sabemos que o ritual é encenado. O prazer, porém, é genuíno. A mulher fuma o cigarro -- não é o cigarro que a fuma a ela. A sua volúpia é consciente e absolutamente genuína. Os seus gestos irradiam segurança. O vício - e seus guarda-costas, automatismo, sofreguidão e ansiedade -, não é para aqui chamado. Esta mulher está ao comando. Não há qualquer afinidade entre o cigarro que ela decidiu fumar e o último cigarro de um condenado qualquer. E é por puro narcisismo que nos toma, a todos nós, por testemunhas. Depois deixa-nos um cinzeiro quase imaculado. Dentro dele, o «último cigarro». Partido. Ardeu o suficiente, sem chegar completamente ao fim. Entretanto, a boca vermelha tatuou-o.
Terá sido realmente, o último? Nem pensem sequer perguntar-lhe. Ela já se foi embora.

Nota: a partir de Rita Barros, The Last Cigarette,
Exhibiton from June 5th- through July 18, 2010, at Ermida N. Sra da Conceição - Belém, Portugal

quinta-feira, julho 15, 2010

Beatriz e o xamanismo cibernético

A Beatriz tem três anos e julga que esta tia, que está em Milão, vive dentro de um computador. Falam pelo skype. Há uma eternidade que isso acontece. Quero dizer, pelos padrões de vida de uma criança tão pequena. Há um ano, ainda mal falava e já trepava para cima da cadeira, as mãos minúsculas agarradas ao rato, à espera que o ecrã se iluminasse com a cara, os gestos, a voz da tia Susana.
Quando isso não acontecia, ficava desolada. Houve alturas em que foi necessário telefonar ou mandar um sms: «liga-te ao skype, a tua sobrinha está de rastos.» Estabelecida a comunicação, ela exultava. Não há outra palavra para defenir a alegria e o assombro em que mergulhava. Quando ela se materializava, a Beatriz não lhe achava a mesma graça. E ainda não acha. Afinal de contas, fora do ecrã é uma tia como as outras.
Agora a Susana está de férias em Portugal e as duas vêm-se com muita frequência. Mas a Beatriz, que ainda acredita que ela é mágica e vive nas misteriosas entranhas de um mackintosh, do qual entra e sai sempre que lhe apetece, só fica verdadeiramente em êxtase quando comunicam pelo skype. Nessa altura, a comunicação entre ambas sobe para outro patamar. É puro xamanismo cibernético.

terça-feira, julho 13, 2010

Maria Adelaide Coelho voltou ao Conde de Ferreira

A história de Maria Adelaide Coelho da Cunha foi tema do último painel do 1º Colóquio da Historia da Psiquiatria, «Luzes e Sombras do Alienismo em Portugal». A seguir, Joana Amaral Dias falou sobre Ângelo de Lima e por fim Manuel Correia sobre Raul Proença. Adrián Gramary, director clínico do Centro Hospital Conde de Ferreira e grande impulsionador do evento, moderou a sessão.

Eu gostava de ter cumprido os 20 minutos da palestra, em vez de demorar quase 30. Mas no fim, uma sensação quase irreal sobrepôs-se aos defeitos que, de imediato, atribui à minha prestação: 92 anos depois de ter saído do Hospital Conde de Ferreira, Maria Adelaide Coelho da Cunha, aqui abusivamente internada por ordem do marido, com o apoio da família e dos mais ilustres psiquiatras portugueses, voltou a esta casa. Gloriosamente. Estava em grande plano no painel que contava a sua vida, à entrada da sala onde o colóquio decorreu. Nas conversas de intervalo. E por fim, foi tema de um debate que começou depois de nós todos termos ido embora, entre os chocados psiquiatras que estavam na sala e que não queriam acreditar no que tinham ouvido.
Maria Adelaide também esteve na assistência, na memória dos que ainda conviveram com ela: Maria Elisa Seara Cardoso Perez, que recorda o seu carisma vivíssimo e a sua inteligência superior, trazia na carteira o espelho de prata que «A senhora dona Adelaide me ofereceu pelo meu casamento. A minha mãe e ela foram grandes amigas. E eu continuei essa amizade.»
Comovidíssimo, José Manuel Cardoso, sobrinho direito de Manuel Claro, que viveu com o casal até aos cinco anos de idade (e que guarda memórias indeléveis daquela tia maravilhosa, tão diferente de todas as pessoas que conhecia), mal conseguia conter a emoção. E Clara Maria Braga da Cruz Mendes Ferrão, dona do palácio de S. Vicente, onde ainda se conserva grande parte da documentação preciosa que utilizei para escrever a sua biografia. Estava ali, escondida, desde os tempos de Alfredo da Cunha que acumulou todo este material, e foi descoberta quando em 2001 começaram as obras de restauro: «Esta história tem de ser contada», disse-me a Clara mal tinhamos acabado de nos conhecer. «É preciso fazer justiça.»
A justiça que Adelaide invocou quando entrou para aqui, há quase cem anos, por «crime de amor» e esteve isolada no Pavilhão das Criminosas. Por duas vezes. Sem voz, sem meios, sequestrada e tratada de forma profundamente cruel, Maria Adelaide Coelho jurou que ia provar A TODOS não ser doida, levasse o tempo que levasse. Nem que fosse a sua vida inteira. Demorou mais, mas foi a tempo de o fazer na presença de algumas das pessoas que ainda a conheceram e amaram. Antes disso, porém, venceu a primeira batalha. A da liberdade. Depois, viveu plenamente por muitos e bons anos. Ao lado de Manuel Claro.

domingo, julho 04, 2010

O céu não é perfeito

Deuses entram em guerra uns contra os outros.
Anjos zangam-se e separam-se. Alguns até choram.
Nessas alturas, as portas do céu fecham-se e nós não podemos fazer nada.

Nota: a propósito da separação entre Madredeus e Teresa Salgueiro.

O comando da nossa televisão

Pifou.
Agora, mudar de canal, subir o som ou baixá-lo obriga a manobras complicadas que se auto excluem. Mudar de canal, por exemplo, pode resultar em ir parar ao video desligado. Além disso não é prático, porque obriga a levantar do sofá muitas vezes. Temos um mamarracho enorme, que ainda não trocámos por causa das mudanças no sistema de captação e difusão das imagens que vao implicar novos aparelhos.
Como ver televisão, cá em casa, é um desporto que só começa à noite, com o telejornal, e segue com as séries da RTP2 (antes e depois das notícias), o sistema começa a tornar-se perfeito. Por inércia, ninguém corre para as minúsculas filas de botões escondidos no receptor. Ver videos é impossível: o formato come as legendas e não dá para corrigir, como fazíamos com o comando à distância. Assim, vê-se um filme no computador, sem publicidade a interromper. Vi dois assim, esta semana. Excelentes, aliás.
As pilhas de livros que tenho de ler e reler, o tempo para conversar ou simplesmente pensar, aumentou substancialmente. Já passaram quinze dias sobre o «acidente» ao qual já nem nos referimos. É implícito que tudo vai continuar assim, e estamos de acordo que é um sossego.

sexta-feira, julho 02, 2010

Encontrou-se um livro

Ah que bom. Afinal continua cá. O meu livro que julguei ter perdido. Vou começar dentro de poucas semanas. Já o amo, apesar do trabalho todo que me vai dar concebê-lo e executá-lo.
Uma alegria.