Na cristandade ocidental do século XV, sabia-se, de ciência certa, tudo quanto havia para saber sobre a Terra e arredores. Este conhecimento era avalizada por sábios da Antiguidade e por sábios cristãos. Suspensa no abismo, imóvel, plana, rodeada por astros que navegavam no céu à sua volta, numa dança estabelecida por Deus, e transcrita na Bíblia, Terra estava dividida em três continentes. Tinha a forma de um tabernáculo e Jerusalém estava ao centro. Era, na verdade, o seu umbigo terreno.
Sabia-se também que algures, a Oriente -- representado nos mapas a Norte -- ficava o Paraíso Terreal. Náo existia semelhante coisa, como Antípodas. Era ridículo, e de algum modo sacrílego, imaginar que debaixo de nós, viviam humanos de cabeça para baixo.
As águas do mar que se estendia para Ocidente, face ao ultimo reino da Peninsula Ibérica, Portugal, precipitavam-se no abismo. Confinavam provavelmente com o inferno. A Sul, porém, o mar fervia e vida alguma era possivel encontrar-se nas proximidades dos trópicos.
Os nautas portugueses vão desmantelar, ainda no século XV e no palco marítimo da sua ousadíssima experiência, todo este saber académico e clerical. No século XVI vive-se já todo um novo paradigma. A Terra é muito maior do que aquilo que santos e sábios e sábios-santos tinham afirmado, e tinha continentes que não estavam contemplados nas Sagradas Escrituras. Havia tanta coisa, mas tanta coisa, em que estes se tinham enganado...
Por um brevíssimo espaço de tempo, a realidade ultrapassava a ficção. Em Lisboa, cidade efeverescente e encantada, o maravilhoso entrava no registo do quotidiano. E a experiência «madre das cousas» passava a ter lugar cativo e principal na apreensão das realidades.
Que tempos!!
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