Era um livro grande e muito antigo. Séculos de pó cobriam-lhe a capa e as lombadas. Quando desfolhava as suas páginas, as palavras cresciam no ar à nossa volta, tomavam forma e vida e acompanhavam-me até adormecer. Acho que, de algum modo, me acompanhavam também durante uma parte do sono, mas isso não posso garantir, porque me não lembro.
Era um livro que, de tanto o folhear, se transformou num hábito e numa presença imprescindível. Eu bebia-lhe as palavras e ele alimentava-se de mim.
Era intenso e acompanhava-me há quase dois anos.
Só faltava mesmo escrevê-lo.
Entretanto perdi-o. Não se se o perdi para sempre, ou se, pelo contrário, a nossa separação é transitória.
Mas enquanto não souber, tenho de continuar a procurá-lo, sem descanso. Nessa procura, encontrei outro que dormia há oito anos num ficheiro escondido numa antiga memória de computador. Sobreviveu, escondido, à morte de três laps. Agora, leio e releio as suas 100 e muitas páginas e não sei por onde ele me queria levar. Trabalho às apalpadelas, abrindo caminho entre frases e capítulos, sem descortinar o caminho que deveriam seguir, a tentar decifrar a sua alma secreta, com sentimentos contraditórios de encanto, espanto e melancolia.
Os livros são muito misteriosos.
Sem comentários:
Enviar um comentário