Nunca a corte de Henrique VIII foi tão alegre como nos dias em que Ana de Bolena, presa na Torre de Londres, aguarda a sua execução. Festas e banquetes sucedem-se ao som de uma música interminável que não deixa ninguem dormir e traz em sobressalto as populações riberinhas. A alegria não toca todos da mesma maneira. Os próprios cortesãos forçam sorrisos que mal escondem o espanto e o choque e os embaixadores disfarçam o desprezo. Só o rei está exultante o que é mais aterrador.
Na antecamara do túmulo, a mulher pela qual o rei afrontou o papa e criou a sua própria igreja, está reduzida a nada. A bela que levou o soberano inglês a repudiar a esposa legitima, infanta de Castela e irmã do poderoso imperador Carlos V, vive os últimos dias de vida numa masmorra ... e prepara o pescoço para a espada do carrasco, experimentado roupa até se decidir pelo vestido de damasco cinzento cuja gola podia ser removida, tornando visivel o seu longo e fino pescoço branco. E escolhendo penteados, até se decidir pela trança sobre a nuca para não estorvar a espada.
Será decapitada a 18 de Maio de 1536.
Mas o dia passa e... nada. Em vão o condestável a tenta confortar pelo adiamento porque a rainha de Inglaterra está para lá de todo conforto, e rebenta subitamente num ataque de riso histérico. «Vi tanta gente morrer» - escreve o condestável - «mas nunca ninguem que saudasse a morte com tamanha alegria e semelhante prazer».
O resto do dia, Ana Bolena leva-o a falar com as damas que a acompanham, recordando a sua vida passada e projectando a sua fama futura:
- Passarei à história com o cognome de A Rainha sem cabeça - disse-lhes. E voltou a explodir numa gargalhada sem fim.
No dia 19 de Maio de 1536, Ana Bolena enfrentou com coragem o carrasco vindo de Calais com a espada que ela exigira, em vez do machado, indigno de cortar um pescoço real. Nas suas últimas palavras do cadafalso erguido dentro da Torre de Londres, disse à reduzida assistência:
- Não vim aqui para falar, mas para morrer.
Depois isentou-se de todas as acusações de adultério, e repetiu que amava o rei. A seguir ajoelhou, pediu a uma das damas que a acompanhavam que lhe vedasse os olhos, e murmurou:
O carrasco foi gentil porque foi de uma imaculada eficácia.
Ulisses avisou-me: muitas querem falar mesmo que só queiramos ouvir uma.
É por isso que estas histórias transversais de personagens que cruzam o pano de fundo da história da minha rainha, se me impõem.
Ulisses disse-me para usar a espada e afastar as instrusas. Não consegui fazer isso com Ana Bolena. Com ela não.
Na antecamara do túmulo, a mulher pela qual o rei afrontou o papa e criou a sua própria igreja, está reduzida a nada. A bela que levou o soberano inglês a repudiar a esposa legitima, infanta de Castela e irmã do poderoso imperador Carlos V, vive os últimos dias de vida numa masmorra ... e prepara o pescoço para a espada do carrasco, experimentado roupa até se decidir pelo vestido de damasco cinzento cuja gola podia ser removida, tornando visivel o seu longo e fino pescoço branco. E escolhendo penteados, até se decidir pela trança sobre a nuca para não estorvar a espada.
Será decapitada a 18 de Maio de 1536.
Mas o dia passa e... nada. Em vão o condestável a tenta confortar pelo adiamento porque a rainha de Inglaterra está para lá de todo conforto, e rebenta subitamente num ataque de riso histérico. «Vi tanta gente morrer» - escreve o condestável - «mas nunca ninguem que saudasse a morte com tamanha alegria e semelhante prazer».
O resto do dia, Ana Bolena leva-o a falar com as damas que a acompanham, recordando a sua vida passada e projectando a sua fama futura:
- Passarei à história com o cognome de A Rainha sem cabeça - disse-lhes. E voltou a explodir numa gargalhada sem fim.
No dia 19 de Maio de 1536, Ana Bolena enfrentou com coragem o carrasco vindo de Calais com a espada que ela exigira, em vez do machado, indigno de cortar um pescoço real. Nas suas últimas palavras do cadafalso erguido dentro da Torre de Londres, disse à reduzida assistência:
- Não vim aqui para falar, mas para morrer.
Depois isentou-se de todas as acusações de adultério, e repetiu que amava o rei. A seguir ajoelhou, pediu a uma das damas que a acompanhavam que lhe vedasse os olhos, e murmurou:
Oh God, have pity on my soul.
O carrasco foi gentil porque foi de uma imaculada eficácia.
Ulisses avisou-me: muitas querem falar mesmo que só queiramos ouvir uma.
É por isso que estas histórias transversais de personagens que cruzam o pano de fundo da história da minha rainha, se me impõem.
Ulisses disse-me para usar a espada e afastar as instrusas. Não consegui fazer isso com Ana Bolena. Com ela não.
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