A propósito de tudo quanto corre mal em Portugal, e são muitas coisas, de certo, é recorrente insultar-se o povo que somos. Não são os de fora. É auto-insulto: nós -- os TUGAS, dizem ou escrevem os próprios tugas -- somos nojentos, incompetentes, broncos, imbecis, retardados, ejaculadores precoces, com menos cromossomas que macacos rhesus. Por causa do trânsito, das falta de leis ou da sua inoperância, da qualidade do vinho, das moscas no Verão, e por aí fora. Circunscrevendo problemas e questões de peso, que merecem e precisam de ser equacionadas, ou nem isso. Simplesmente, e pelo insulto, acrescentando o problema. As palavras não são inócuas. O verbo é uma natureza e essa natureza é uma força tremenda. Em todos os sentidos.
É tão estranho. É como se quem insulta fosse imune à chicotada verbal que desfere no próprio grupo... É uma doença terrível. É o síndrome da criança mal amada e espancada (mental e fisicamente) que antes de ser insultada já se está a insultar a si própria. Todos nós já ouvimos ou conhecemos casos assim. É pungente ouvir uma criança a repetir com ar muito calmo: «ah, eu não faço nada bem. Sou um desastrado.» Ou, «Sou mesmo estúpido», ou «porco», ou, ou. Por detrás desta afirmação negativa, qualquer psicólogo ou psiquiatra o dirá de caras, está um imprint brutal causado no seio da própria familia.
Acontece que por motivos, provavelmente históricos (eu tenho essa convicçao profunda) nós passamos a vida a fazê-lo a propósito de tudo o que corre mal. Nenhum outro povo do mundo o faz. Tenho perguntado a muita gente de muitos países diferentes. A reacção é pela estranheza. O conceito nem é conhecido.
Proponho um exercicio de auto-análise: vejamos a quantidade de vezes em que, por exemplo, no Facebook, pessoas altamente diferenciadas, o fazem. Os outros países fizeram algo de muito bom? Nós nao! Somos os tugas estúpidos. Perdemos um jogo de futubol tendo chegado quase aos primeiros lugares num campeonato? Somos uma pátria em risco de vida porque nós, os tugas impotentes, até no futubol somos uma merda. Há cães abandonados nas férias? Culpa dos tugas (nós todos, portanto) que somos um nojo de cidadãos. Como se o abandono de animais, uma praga horrível, fosse um probloema especifico do nosso país. Matamos nas estradas? Somos tugas assassinos. Os outros não. É só auréolas e asas pelas estradas do mundo nao tuga. Por acaso quando chegam as leis e as multas, somos tugas otários: temos polícias gananciosos. Redes de emails em catadupa avisam os pontos em que é preciso tomar atenção. Vá lá, nesse aspecto, somos tugas solidários.
Então e que chamar à maioria? Que se solidariza com causas, que guia com cuidado, que percebe e cultiva a cidadania? Ah, esses serão os que podem insultar os outros chamando-lhes «tugas» isto e aquilo?
Temos outras armas na mão, muito mais eficazes do que a auto-mutilação em grupo. Por favor, para nosso bem, ganhemos um pouco mais de auto-estima.