Ás vezes a única maneira de entender o quadro é saltarmos para fora dele e olhar o desenho de fora. Dizem, ah tu não ligas nada, tu não queres saber. Digo: é por querer saber, é por ligar tudo, que tenho de ficar mais longe. Menos ruído e infinitamente menos confusão, porque a Torre de Babel desaparece na cacofonia das cores de uma pintura esborratada, que assim se apresenta sobre outra luz, com todo um outro desenho. Não é menos assustador. É simplesmente mais solitário e mais completo. A seguir, o tempo recorda que tudo isto se passou assim, desta mesma maneira, noutro palco, com outros cenários, os mesmos actores, roupas diferentes, regras distintas em cada um desse desenrolar do drama e da comédia da vida. Porquê? Porque há um esforço constante, aturado, e feroz, para se matar a memória. É essa a única, a real tragédia. Mas a seguir, até o medo se esfuma na areia do tempo, que nos recorda a impermanência tão perene do ser.
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