Era alto, mais alto do que a maior parte dos homens, e estava, sempre, coberto de uma armadura que o protegia dos pés à cabeça. Aliás, tinha várias, consoante andava a pé ou a cavalo. Todas primorosamente executadas e belas, conjugando metais raros e couros de animais desconhecidos. Do rosto, apenas as pupilas se deixavam entrever. Desta forma, dele se podia dizer quase tudo. Que era loiro, moreno, novo ou adiantado em anos. Que nunca sorria, ou que o fazia com frequência. Que desconhecia o amor ou que, tendo-o conhecido, o perdera para sempre.
Ele era uma fonte viva de lendas múltiplas.
As mulheres suspiravam à sua passagem.
Os homens temiam-no e, secretamente, detestavam-no.
Mas ele parecia indiferente ao efeito que produzia à sua passagem e os seus soldados, armados, também eles, até aos dentes, tinham de ser ríspidos com as crianças que, a todo o custo, se queriam abeirar dele. Uma vez, uma menina tocou-lhe. Durante dias foi passeada pela aldeia em triunfo, obrigada a repetir até às lágrimas, até à náusea, até à exaustão, tudo o que se passara no brevíssimo espaço de tempo em que, furando por entre as pernas musculadas de uma dúzia de homens de armas, chegara até ao metal que protegia os pés do guerreiro. Então curvara-se e beijara o pó que embaciava a fivela da armadura, no ponto do tornozelo. A sua boca pequenina deixara ali uma marca em forma de coração.
Ela jurava que tinha sentido o guerreiro estremecer.
Depois, mãos brutais agarraram-na e ela foi jogada ao chão, para longe, caindo na estrada sem se magoar. Estava em êxtase e a queda pareceu-lhe um voo.
Apenas uma criança se mantinha à parte quando o guerreiro passava com a sua comitiva eriçada de lanças e espadas, protegida por grevas, escudos e elmos, rumo ao castelo de fortes ameias no alto do monte fronteiro à aldeia.
Um dia, o guerreiro parou e fez um sinal a um dos seus guardas, que se aproximou do miúdo, e, pegando-lhe ao colo o levou até junto de si. Então, todas as crianças sustiveram a respiração, todas as mulheres levaram as mãos ao rosto, sustendo gritos e todos os homens se curvaram sentindo um gelo nas entranhas e um nó na garganta.
- Podes fazer uma pergunta ao Guerreiro. Uma só - disse o soldado, numa voz que parecia chegar do outro lado do mundo.
A criança estava calma. Era um menino de seis anos, o tonto da aldeia. A sua mãe, jovem e viúva, era profundamente só. As mulheres temiam a sua beleza, os homens temiam a intensidade do desejo que sentiam por ela. Além disso, tinha um filho que dizia coisas estranhas a propósito de nada, e olhava as pessoas como se as visse à transparência.
O soldado pôs o menino no chão. No silêncio total que se seguiu e que durou uma eternidade, todos retiveram a respiração até se ouvir a sua voz cristalina perguntar:
- Guerreiro, de que tens tu tanto medo?
Ele era uma fonte viva de lendas múltiplas.
As mulheres suspiravam à sua passagem.
Os homens temiam-no e, secretamente, detestavam-no.
Mas ele parecia indiferente ao efeito que produzia à sua passagem e os seus soldados, armados, também eles, até aos dentes, tinham de ser ríspidos com as crianças que, a todo o custo, se queriam abeirar dele. Uma vez, uma menina tocou-lhe. Durante dias foi passeada pela aldeia em triunfo, obrigada a repetir até às lágrimas, até à náusea, até à exaustão, tudo o que se passara no brevíssimo espaço de tempo em que, furando por entre as pernas musculadas de uma dúzia de homens de armas, chegara até ao metal que protegia os pés do guerreiro. Então curvara-se e beijara o pó que embaciava a fivela da armadura, no ponto do tornozelo. A sua boca pequenina deixara ali uma marca em forma de coração.
Ela jurava que tinha sentido o guerreiro estremecer.
Depois, mãos brutais agarraram-na e ela foi jogada ao chão, para longe, caindo na estrada sem se magoar. Estava em êxtase e a queda pareceu-lhe um voo.
Apenas uma criança se mantinha à parte quando o guerreiro passava com a sua comitiva eriçada de lanças e espadas, protegida por grevas, escudos e elmos, rumo ao castelo de fortes ameias no alto do monte fronteiro à aldeia.
Um dia, o guerreiro parou e fez um sinal a um dos seus guardas, que se aproximou do miúdo, e, pegando-lhe ao colo o levou até junto de si. Então, todas as crianças sustiveram a respiração, todas as mulheres levaram as mãos ao rosto, sustendo gritos e todos os homens se curvaram sentindo um gelo nas entranhas e um nó na garganta.
- Podes fazer uma pergunta ao Guerreiro. Uma só - disse o soldado, numa voz que parecia chegar do outro lado do mundo.
A criança estava calma. Era um menino de seis anos, o tonto da aldeia. A sua mãe, jovem e viúva, era profundamente só. As mulheres temiam a sua beleza, os homens temiam a intensidade do desejo que sentiam por ela. Além disso, tinha um filho que dizia coisas estranhas a propósito de nada, e olhava as pessoas como se as visse à transparência.
O soldado pôs o menino no chão. No silêncio total que se seguiu e que durou uma eternidade, todos retiveram a respiração até se ouvir a sua voz cristalina perguntar:
- Guerreiro, de que tens tu tanto medo?
«Shinto» cortesia de Wikia
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